No capítulo anterior, entramos em contato com as principais características do estilo romântico, conhecendo os diferentes poetas de tal período. Agora, estudaremos os textos organizados em prosa, já que há distintas intenções entre a poesia e a prosa da estética romântica.
INTRODUÇÃO
A prosa romântica manifestou-se, sobretudo, por meio de romances (longas narrativas que, no período em questão, apresentavam enredos sobre amor ou aventura em torno dos valores burgueses). A maioria dos textos da época era publicada sob a forma de folhetins, nos jornais do Rio de Janeiro. O folhetim era uma espécie de suplemento cultural dos jornais do século XIX, um espaço no qual os romances eram divulgados em capítulos e, posteriormente, recebiam a forma de volume.
Devemos lembrar que, neste momento, surgiu um grande público leitor em busca de uma forma de entretenimento, por isso, os romances centravam-se na descrição dos costumes urbanos ou apresentavam personagens imponentes, concebidos pela imaginação e pela ideologia romântica com os quais o público se identificava.
A ESTRUTURA DA NARRATIVA
Os romances românticos trazem enredos simples e, por vezes, repetitivos. A estrutura típica apresenta um casal apaixonado que enfrenta diferentes obstáculos sociais e morais a fim de validar seus sentimentos.
Os personagens não apresentam densidade psicológica, sendo, portanto, altamente previsíveis. Há forte presença do maniqueísmo. Assim, o antagonista terá a maldade como elemento principal, já o protagonista é corajoso e bom. Triunfará, nessas narrativas, sempre o bem, por isso, é comum a presença de um desfecho feliz. São raros os exemplos de enredos marcados pelo fatalismo amoroso.
Por fim, deve-se lembrar que são comuns estruturas de enredo linear em que prevalecem inúmeras descrições de carga subjetiva.
TIPOS DE ROMANCES
Temos quatro tipos de romances no movimento: o indianista, histórico, regional e urbano. Era bem comum que os escritores da prosa do período caminhassem entre os vários tipos. José de Alencar, por exemplo, escreveu livros que contemplam todos os estilos.
ROMANCES INDIANISTAS
O romance indianista traz à tona a vida, a cultura, a crença e os costumes indígenas. O índio torna-se protagonista heroico e idealizado, é descrito como corajoso, forte e gentil. Além disso, há uma forte valorização da natureza, já que a paisagem brasileira torna-se o espaço dessas obras.
Exemplos de romances indianistas:
Iracema, O Guarani e Ubirajara, todos de José de Alencar.
Observe o fragmento do livro Iracema e entenda melhor.
“Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.
Mais rápida que a corça selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
Um dia, ao pino do Sol, ela repousava em um claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho: o aljôfar d’água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o uru de palha matizada, onde traz a selvagem seus perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara com que tece a renda, e as tintas de que matiza o algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.”
A cena narra o encontro da indígena com o português Martim. Para caracterizá-la, Alencar usa os elementos da natureza, criando, por meio de metáforas e de comparações, uma descrição subjetiva e muito idealizada. Ela representa o Brasil, bem como sua beleza natural e exotismo.
ROMANCES REGIONALISTAS
O romance regionalista, passado em ambiente rural, mostra costumes, valores e cultura típica de uma região. Este tipo de romance trazia um maior conhecimento do Brasil sobre si próprio, uma vez que voltava seu olhar pra regiões diferentes do Brasil, trazendo à tona sua diversidade.
Neste cenário rural, há um herói do campo, sertanejo, alguém que pertence à sua terra e é o retrato desta. É bravo e honrado, preza a moral e os costumes de seu ambiente, colocando-se contrário às liberalidades da cidade e dos homens de lá. É importante ressaltar que não há tensão social no romance romântico regionalista, sendo este apenas um retrato regional de costumes, sem críticas.
Alguns exemplos de romances regionalistas são: Inocência, de Visconde de Taunay; O Tronco do Ipê, Til e O Gaúcho, de José de Alencar; A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães.
ROMANCE HISTÓRICO
O romance histórico traz o retrato de costumes de uma época passada, sendo um relato que muitas vezes mistura ficção e realidade. As Minas de Prata e A Guerra dos Mascates, ambos de José de Alencar são valiosos exemplos. É importante saber que romances indianistas também podem ser considerados históricos.
ROMANCES URBANOS
São os mais lidos até hoje. Em sua grande maioria, narravam uma história que geralmente ocorria nas capitais, na alta sociedade. Funcionava como narrativa de costumes, já que mostrava a sociedade e os interesses desta em uma determinada época. Os heróis e heroínas deste romance faziam ou não parte da alta sociedade e tinham que superar várias barreiras para a felicidade e para a realização do amor e do casamento (que redimia as personagens de todo o mal e imoralidade que elas pudessem ter), tal como nos outros tipos de romances românticos.
Exemplos de romances urbanos:
Lucíola, Diva, Senhora, A Viuvinha, todos de José de Alencar; A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo; e Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida, que surge trazendo à tona os costumes da periferia, indo na contramão do retrato de costumes da alta sociedade, algo raro neste tipo de romance.